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Regularidade alimentar
É com a massa corporal que solidificamos a nossa presença no mundo, ocupamos o nosso espaço, nos apresentamos aos outros, afirmamos a nossa presença, re-afirmamos a nossa identidade. Altura X Largura. E, enquanto, que a altura raramente propicia desconfortos significativos susceptíveis de nos levar a procurar ajuda, a largura – isto é, o peso no sentido de “gordo-magro” – é um tópico frequente em psicoterapia e de base a algumas perturbações psicológicas importantes.

As perturbações do comportamento alimentar, como a bulimia e a anorexia, podem ter uma expressão grave e que requer cuidados multi-disciplinares, entre os quais se contam sempre os psicoterapêuticos. A bulimia e a ingestão compulsiva têm tido um crescimento alarmante na última década assumindo uma presença significativa no consultório de Psicologia.
É sobejamente conhecido que a obesidade cresce exponencialmente no mundo desenvolvido, fazendo perigar de tal forma as condições de saúde pública que já começa a existir toda uma mobilização de organismos públicos que visa a prevenção e o estudo de intervenções eficazes na redução de peso. Enquanto que se trata de um tema abrangente a várias áreas e para o qual contribuem o sedentarismo a que nos acomodámos, a qualidade da alimentação disponível, o tema da abundância dos países desenvolvidos e tantos outros factores, existem variados aspectos que se prendem com o contexto psicológico/emocional e que afectam o consumo alimentar de uma forma crítica para o aumento descontrolado do peso.
O acto alimentar é muitas vezes um sucedâneo disfuncional de boas estratégias reguladoras de emoções, pelo que é fundamental um trabalho a este nível e mesmo de aprendizagem de boas técnicas reguladoras dos sobressaltos emocionais. Além disso, revela-se importante intervir no controlo de impulsos e motivação para suster hábitos alimentares saudáveis e ajustados a cada pessoa, algo que também incluímos nos nossos programas de trabalho na obesidade.

Uma coisa é certa: vários estudos demonstram uma maior eficácia das intervenções que integram a componente alimentar, associada à prática da actividade física e à modificação dos comportamentos.

Tem-se verificado que saber o que é uma alimentação saudável e/ou qual a quantidade mínima necessária de exercício físico diário, não são, à partida, uma garantia de perda de peso. Assim, torna-se fundamental que para além da aquisição da informação as pessoas percebam como concretizar as mudanças necessárias, de forma a que possam ser integradas nas suas rotinas e hábitos diários.

Gostaríamos de lhe dizer também que para haver uma mudança de comportamento é muito importante a sua motivação, mas que a aliança do conhecimento e da motivação não são por si só suficientes, é fundamental que o contexto físico, económico, social e cultural reúnam condições que facilitem e permitam a prática dos novos comportamentos. Não desalente; se está motivado, siga em frente, porque a sua energia não será desperdiçada: estamos aqui e consigo para perceber e integrar estes dados na especificidade de cada intervenção que pretendemos sempre que promova uma alteração dos estilos de vida, de forma a ser possível garantir a manutenção das mudanças a longo prazo.

Para quem tem problemas alimentares, ou sofre mesmo de uma perturbação alimentar, a experiência de estabelecer hábitos de ingestão regulares, assume-se muitas vezes assustadora. A possibilidade de cometer excessos, para além dos que já ocorrem habitualmente, que podem desencadear novos descontrolos e um ainda maior aumento de peso, é uma preocupação comummente expressa. Contudo, quando se passa à prática, e esses hábitos são instituídos no dia-a-dia, verifica-se que são fundamentais para contrariar os excessos e criar um padrão duradouro. É que o estabelecimento de um padrão de ingestão regular permite promover:

* A desmistificação do acto de comer, retirando-lhe a importância e a negatividade que costuma ter e assumindo-se como mais um comportamento diário habitual;
* A redução do risco de “fomes intensas”, que tão facilmente desencadeiam excessos alimentares, através de uma ingestão disciplinada – comendo no máximo de 3 horas em 3 horas;
* A estabilização do apetite, através da estruturação dos hábitos alimentares;
* A contenção de comportamentos alimentares dispersos, como o “picar” ou o “petiscar”, que tendem a potenciar ingestões desmedidas com muita frequência;
* A regulação dos níveis de açúcar no sangue, minimizando sensações de cansaço ou de irritabilidade, por exemplo, e fornecendo energia ao longo do dia;
* A estabilização metabólica, reduzindo a absorção dos nutrientes ingeridos, apenas àqueles que são necessários ao funcionamento do organismo;