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Fabiana Andrade

Fabiana Andrade

Laura tem 37 anos e foi mãe de Clara aos 35. Fui contatada pelo marido de Laura, António, pois estava muito preocupado com a mulher. Laura tentou engravidar durante 4 anos e quando finalmente conseguiu, tanto ela como António ficaram extremamente felizes e esperançosos sobre as mudanças positivas que um filho poderia trazer para a sua vida.

Neste processo de 4 anos, Laura tinha-se sentido deprimida algumas vezes, com alterações do sono e do apetite, choro fácil, falta de energia e dores no corpo. Nunca procuraram ajuda pois achavam que isso seria natural tendo em conta que estavam frustrados por não conseguirem engravidar. Ao mesmo tempo, nessa época, Laura perdeu o seu pai num acidente de viação e ficou muito frustrada no trabalho aquando da nomeação de um novo chefe para a sua equipa, quando esperava que esse lugar fosse atribuído a si.

Durante a sua gravidez, Laura oscilou entre uma extrema felicidade e uma intensa ansiedade. Dizia a António que suas preocupações eram imensas e constantes, que tinha vários pensamentos incontroláveis tais como: “será que vou ser boa mãe?”, “será que meu filho vai ser saudável?”, “e se lhe acontece alguma coisa?”. António sabia que todas as mães de “primeira viagem” experienciam uma maior ansiedade com a chegada do filho, por isso não se preocupou com o nervosismo de Laura, pensando sempre que com o nascimento da bebé ela voltasse a ficar mais calma e estável.

Clara nasceu uma bebé saudável, para felicidade dos pais, mas essa felicidade foi desde cedo interrompida por uma cada vez maior instabilidade em Laura. Começou a ter insónias, pensando sempre que se deveriam ao cansaço dos horários da bebé. O seu apetite oscilava entre ataques vorazes à cozinha e uma total falta de apetite. Passou a chorar com muita facilidade, e cada vez estava mais ansiosa. Tinha medo que Clara morresse enquanto dormia, então passava horas a observá-la só para ver se respirava. Isolou-se dos amigos e família e mesmo do próprio António. Estava sempre cansada e irritada. Passados 6 meses, António começou a perceber que estes sintomas pareciam já ser duradouros e desproporcionais, e começou a estar mais preocupado com o equilíbrio da mulher. Ela estava mesmo cada vez pior, o que afetava a sua relação com todos, inclusive com a bebé. Cada vez que a bebé chorava, Laura ficava impaciente e chorava também. Dizia “não aguento mais este som!”, “preferia morrer, mais valia desaparecer pois sou péssima mãe”, entre outras frases cheias de culpa, tristeza e cansaço.

Depois de ter feito algumas pesquisas online sobre depressão, António decidiu procurar ajuda e entrou em contacto comigo. Recebi os dois no consultório da Oficina de Psicologia. Vi uma mulher extremamente cansada, com olheiras, apática, irritada, e sem grande clareza sobre o que poderia estar a acontecer. Não tinha muita vontade de estar ali e nem de conversar sobre o que quer que fosse. Percebi rapidamente que, pela história e sintomatologia de Laura, havia uma grande probabilidade dela ter estado deprimida desde a morte do pai, mantendo esse quadro durante a fase em que tentava engravidar. Considerando a sintomatologia depressiva prévia à gravidez e as alterações hormonais típicas de uma gestação, a Laura parecia estar a sofrer de depressão pós parto. Encaminhei-a para uma avaliação psiquiátrica e o diagnóstico foi confirmado, mas como Laura estava a amamentar, não foi medicada.

Assim, iniciamos um trabalho intenso de psicoterapia, onde trabalhámos aspetos como: clarificação sobre o que era depressão, desconstrução de crenças negativas a seu respeito, diminuição dos pensamentos antecipatórios negativos e medos e conhecimento dos seus pensamentos, emoções e sensações com recurso ao Mindfulness, estratégias para uma comunicação eficaz para melhorar a qualidade das suas relações nesta fase.

Laura foi acompanhada pelo psiquiatra para poder vigiar o seu funcionamento hormonal, pôde tomar algumas vitaminas e suplementos, que a ajudaram a manter-se mais equilibrada. Foi também acompanhada por uma nutricionista, para que a sua alimentação passasse a ser utilizada como aliada na cura da sua sintomatologia depressiva.

Depois de um processo intenso de 6 meses, onde a ajuda do marido António, foi fundamental, Laura finalmente sentia-se uma mulher renovada e pela primeira vez desde que Clara nasceu, pôde aproveitar a felicidade da maternidade. Continuou a fazer terapia para trabalhar nas causas originárias deste processo, e prevenir que uma resposta depressiva voltasse a surgir no futuro. Melhorou o seu auto conhecimento, o acesso às suas ferramentas de regulação, tais como a respiração, Mindfulness, técnicas de relaxamento, e teve alta um ano após ter iniciado o seu processo.

Pediu-me que um dia escrevesse sobre a sua situação para que todas as pessoas que estivessem na sua situação, não deixassem de pedir ajuda, e é por isso que escrevo estas linhas, para passar a mensagem de Laura a todas as mulheres que possam estar a sofrer desta condição, que tanto nos perturba, nos magoa, nos tira qualidade na relação com nossos bebés e que pode ser resolvida se diagnosticada atempadamente.

É uma mensagem também aos maridos dedicados, que podem ser, tal como António, o facilitador do processo terapêutico.

Estamos cá para si, se precisar! 

Fabiana Andrade – Psicóloga Clínica responsável pela área de Saúde Feminina do Top Clinical